sábado, 25 de janeiro de 2014

Um Porto nem tão seguro assim


Reunião Commads de 14 de Janeiro de 2014


A Audiência Pública para a apresentação do Relatório de Impacto Ambiental (Rima) do processo de licenciamento do Terminal Logístico de Macaé – Terlom, na Praia do Barreto, ocorrida no dia 15 de Janeiro, trouxe à tona não apenas as graves deficiências nos estudos realizados, apontadas por diversos participantes, mas também, e principalmente, estratégias equivocadas adotadas pelo empreendedor e pela empresa contratada.

 Estas deficiências já haviam sido realçadas no dia anterior à Audiência Pública durante reunião do Conselho Municipal de Meio Ambiente, quando a mesma apresentação foi feita para conselheiros e interessados. Na oportunidade fiz alguns questionamentos, repetidos na Audiência e que resumo a seguir: 

1) Falta de detalhamento ou maior aprofundamento sobre as ações de contrapartidas propostas; 2) Falta de propostas mais consistentes para eliminação ou minimização de impactos sobre a fauna. As propostas de monitoramento das espécies, dentre elas, as Toninhas, são insuficientes e só servem para encher planilhas; 3) Beira ao ridículo propor seminários e ações de educação ambiental para o pescador, segmento mais prejudicado com o empreendimento; 4) Irrisória geração de emprego; 5) Falta de detalhamento dos alcances sociais e econômicos indiretos do projeto sobre os bairros envolvidos; 6) Desconhecimento do fenômeno erosivo que na década de 90, afetou as praias dos Cavaleiros, Pecado, do Arquipélago de Santana em prejuízo de seus sambaquis milenares, e que suprimiu o Pontal, colocando em risco a rua da Praia e o centro da cidade. Estudos indicaram que o fenômeno foi causado pela retirada de areia no bairro Lagomar.

Além destas, muitas outras questões surgiram sem respostas convincentes, como o real alcance de sedimentos revolvidos por processos de dragagem, aparentemente muito maior do que o previsto; escassez de água;  área de influência direta considerada muito reduzida; excessiva proximidade com o Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba, em especial da Lagoa de mesmo nome, sem a pormenorização dos riscos a que se exporá; nenhuma referência ao patrimônio arqueológico existente na área de influência direta do empreendimento; impactos na mobilidade urbana; e muitas outras questões que ficaram sem respostas.

Uma questão, entretanto, considero como chave para obter a compreensão dos fatores que motivaram a preparação de estudo tão superficial e incompleto neste processo de licenciamento: um erro gravíssimo no processo participativo. Em resposta à pergunta que formulei sobre as instituições e pessoas que haviam sido consultadas no processo de licenciamento, ouvimos uma longa e enfadonha resposta sobre as metodologias empregadas, consultas a lideranças locais e associações, tudo muito interessante, mas infelizmente limitada aos bairros situados no entorno do empreendimento.

Lamentavelmente, por definir uma área limitada e irreal para os efeitos da influência direta do empreendimento sobre o meio ambiente e a sociedade, não se estenderam para além dos limites destes bairros. Ou seja, ignoraram solenemente a existência dos segmentos mais críticos da sociedade, representantes de instituições especializadas, fóruns constituídos, experts e o próprio movimento ambiental da cidade, possuidor de vasto currículo no ativismo local e regional.

Todos estes ingredientes, misturados, resultaram numa espécie de comoção e desconfiança crônica destes segmentos excluídos, somado, ainda, à intempestiva convocação de uma audiência pública, deixando pouco tempo para o aprofundamento nos estudos apresentados. E daí aconteceu tudo o que se presenciou nas reuniões sobre o assunto e o que se formou e vem crescendo nas redes sociais.

Erraram ao tentar minimizar os impactos, ao evitar a sociedade civil organizada, e ao tentar “entubar” o processo, se esquecendo do histórico de lutas e vitórias ambientais já conquistadas nesta cidade. Nem na década de 1980, com legislação ambiental frágil, conseguiram “entubar” empreendimentos goela abaixo, a exemplo do movimento “Xô! Monobóia!” e “Fora Pólo Petroquímico!” que deram resposta rápida e eficiente às tentativas de vender gato por lebre em nossa cidade.

Um pena, que tudo isso tenha acontecido no século XXI, em pleno início do IIIº Milênio, quando já está claro a necessidade de projetos ambiental e socialmente sustentáveis, quando já se sabe de cor e salteado que os processos participativos devem ser amplos, irrestritos e, acima de tudo, autênticos; e que qualquer coisa que tente contornar estes princípios, representa retrocesso dos valores que fundamentam a verdadeira democracia  apoiada na ação cidadã e protagonismo ativo da sociedade nas questões que lhe dizem respeito.


Com os estudos que foram apresentados, “XÔ, Porto!”. Se, ao contrário, convocarem uma nova Audiência Pública contemplando os questionamentos feitos pela sociedade, “Talvez, Porto!” com o velho e preventivo “pé atrás!”, porque afinal de contas não convivemos há 30 anos com a indústria do petróleo sem que algum conhecimento sobre os impactos desta atividade, tenhamos acumulado.